0522/2008 - Hypertension control and related factors at primary care located in the west side of the city of São Paulo, Brazil
Controle da hipertensão arterial e fatores associados na atenção primária em Unidades Básicas de Saúde localizadas na Região Oeste da cidade de São Paulo
Author:
• Angela Maria Geraldo Pierin - Pierin, A.M.G - USP - <pierin@usp.br>ORCID: http://orcid.org/0000-0002-3274-7729
Thematic Area:
Não CategorizadoAbstract:
The objective of this study were to characterize blood pressure control of 440 hypertensive patients. The persons were interviewed and blood pressure measurement was taken using an automatic device. The results showed that 45.5% showed an adequate blood pressure control. The persons under control were different (p<0.05) from those without control: persons under blood pressure control were mainly women, younger, with a shorter time of disease, with previous treatment for hypertension, with less interruptions in treatment and more conscious about the importance of physical activities. They also rarely have forgotten to take the medicines at the right time, generally using less than, 3 or more antihypertensive drugs, with family history of cardiovascular diseases, reporting physical activity more frequently and reporting less sadness. The multivariate analysis revealed a statistically significant association of uncontrolled hypertension with previous treatment (OR = 2,26; IC 95%, 1,4-3,6), no family history of cardiovascular diseases (OR = 2,2; IC 95%, 1,3 - 3,5) and unaware of the importance of physical activities for blood pressure control (OR = 3,5; IC 95%, 1,1 - 10,8). Blood pressure control was associated with biological variables, behavior and information about hypertension as a risk factor and its treatment.Key words: Hypertension. Control. Compliance.
Content:
Introdução
A hipertensão arterial é reconhecida como principal fator de risco de morbidade e mortalidade cardiovasculares. Dados do Ministério da Saúde indicam que no ano de 2000 as doenças cardiovasculares foram responsáveis por 32,1% de mortalidade no Brasil (1) . Além disso, a hipertensão arterial é uma doença altamente prevalente. Estudos isolados têm apontado prevalências que oscilam de 22% a 44% (2,3,4,5) porém com baixos índices de controle da doença.
Face ao controle pouco satisfatório da hipertensão arterial, questiona-se quais seriam as justificativas para tal situação. Uma provável explicação estaria ligada ao fato da redução insuficiente dos níveis da pressão arterial pela proposta de tratamentos pouco eficazes. Outra possibilidade para o controle ineficiente dos níveis pressóricos relaciona-se com a pouca ou falta de adesão ao tratamento. Adesão ao tratamento pode ser considerada como “o grau de cumprimento das medidas terapêuticas indicadas, sejam elas medicamentosas ou não, com o objetivo de manter a pressão arterial em níveis normais” (6) . Diversos fatores influenciam nesse processo, tais como as relacionados ao hipertenso como características biossociais; à doença na sua cronicidade, ausência de sintomas e conseqüências tardias; ao tratamento como os efeitos indesejáveis das drogas e esquemas complexos; a aspectos institucionais como acesso ao serviço de saúde; e relacionamento da pessoa hipertensa com a equipe de saúde (7).
Para que se possa atingir e manter os níveis tensionais controlados, o hipertenso freqüentemente requer estímulo constante para as mudanças de estilos de vida e ajustes ao tratamento. Face ao panorama traçado ressalta-se a importância do direcionamento de programas e políticas de saúde para a atenção no contexto da hipertensão arterial. A criação de uma rede de informação que sustente a caracterização da população alvo e viabilize o seguimento do hipertenso constitui etapa importante da assistência.
Atualmente, pouco se tem estudado sobre a atenção aos hipertensos em Unidades Básicas de Saúde na atenção primária. Em 1996, realizou-se estudo sobre essa temática em uma Unidade de Saúde da cidade de São Paulo para avaliar a efetividade do controle da hipertensão arterial. Os resultados mostraram que em 78,8% obteve-se redução na pressão diastólica e sistólica e em 44,4% ocorreu normalização da pressão arterial de acordo com os níveis preconizados pelo programa (8) .
Portanto, frente ao panorama descrito que aponta as dificuldades que existem no manejo do indivíduo com hipertensão arterial, e o pouco conhecimento atual da assistência a essa população na atenção primária, a presente investigação teve como finalidade estudar um grupo de pessoas hipertensas atendidas em Unidades Básicas de Saúde localizadas na Região Oeste da Cidade de São Paulo, cujo objetivo principal foi caracterizar a prevalência do controle da hipertensão arterial, e secundário, identificar variáveis relacionadas, objetivando que os dados resultantes possam contribuir efetivamente para o controle da hipertensão arterial em Unidades Básicas de Saúde e servir de suporte a demais profissionais que se interessem por esta problemática.
Metodologia
Desenho do estudo
Trata-se de um estudo observacional e analítico, tipo transversal que fez parte de um Projeto de Políticas Públicas de Saúde com apoio da FAPESP - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, Processo n0 03/06454-1.
Local do estudo, população alvo e amostragem
O estudo foi realizado no Distrito de Saúde do Butantã na região oeste da cidade de São Paulo que desenvolve atividades de parceria do município com a universidade. O distrito é formado por uma rede de 14 unidades básicas de saúde (UBS), um centro de saúde escola, um centro de referência para DST-AIDS, um CAPS, um centro de convivência, um Ambulatório de Especialidades, um pronto socorro e um hospital municipal. Entre as UBS, três são unidades vinculadas ao Programa de Saúde da Família: Em função das características similares em relação ao PSF, essas três unidades foram escolhidas para a realização do estudo.
A população alvo foi dos indivíduos com hipertensão arterial já diagnosticada e em acompanhamento nas unidades de saúde destacadas. O critério diagnóstico para hipertensão arterial segue o preconizado pelo Programa de Saúde da Família (9) que é de valores acima ou igual a 140 mm Hg para a pressão sistólica e/ou 90 mm Hg para a pressão diastólica em pelo menos duas medidas realizadas em momentos diferentes. A captação dos hipertensos é feita pelos agentes de saúde na visita domiciliar por meio da hipertensão referida; em situações de pronto atendimento pela realização rotineira da medida da pressão arterial independente da queixa e pela identificação nas diferentes áreas de abrangência das unidades, também pela medida rotineira da pressão arterial. Após a rotina diagnóstica e instituição do tratamento os hipertensos são acompanhados por meio de consultas a intervalos médios de dois a três meses.
No cálculo da amostra foi estimado um tamanho mínimo de 137 hipertensos em cada unidade tendo como base uma taxa de prevalência de adesão ao tratamento de 20%, erro alfa de 5%, poder de teste de 80% e possível variação de 30%. Estimando-se possíveis perdas, a meta era atingir 140 hipertensos em cada unidade básica de saúde. No final foram incluídos 147 hipertensos em duas unidades e 146 na terceira, perfazendo o total de 440 pessoas hipertensas estudadas, o que permite que na amostra sejam estudadas algumas associações.
Critérios de inclusão e exclusão
Para composição da amostra os hipertensos obedeceram aos seguintes critérios: diagnóstico de hipertensão arterial confirmado no prontuário médico, em acompanhamento há pelo menos seis meses na unidade básica de saúde, concordância do hipertenso para a participação no estudo através da assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido, ambos os sexos, adultos com idade acima de 18 anos, sem restrição de raça e pertencer à comunidade de abrangência das unidades de saúde do estudo.
Foram excluídos hipertensos com história de abuso de drogas ilícitas, distúrbios mentais e hipertensas grávidas.
Coleta de Dados
A coleta de dados foi realizada no período de novembro de 2004 a março de 2005. A seleção dos entrevistados foi por conveniência no período estudado, porém para evitar possíveis vieses, a seleção dos entrevistados foi realizada nos diferentes dias da semana e nos períodos da manhã e tarde. Para identificação dos hipertensos que atendessem aos critérios do estudo foram consultadas as fichas individuais constantes no prontuário da família e aqueles que preencheram os requisitos necessários foram convidados para participar do estudo, por ocasião de sua vinda à unidade para consulta ou atividades de grupo. Caso o hipertenso tivesse disponibilidade, a coleta dos dados ocorreu no mesmo dia após a sua atividade no serviço, o que aconteceu na maioria das vezes, caso contrário agendou-se uma data específica para tal. As perdas e recusas em participar do estudo foram mínimas.
Os dados foram coletados através de entrevista com o preenchimento de instrumento construído para essa finalidade e medida da pressão arterial. Os dados coletados por entrevista incluíram aspectos biossociais como sexo, idade, escolaridade, ocupação e renda familiar. Na avaliação dos hábitos de vida foram considerados tabagistas aqueles que referiram uso atual de cigarro, cachimbo ou charuto e ex-tabagista os que abandonaram. Na ingestão de bebida alcoólica foi perguntado se faz uso ou não, ou abandonou ingestão de bebida alcoólica, caso sim foi caracterizado o tipo de bebida (destilada ou fermentada). Considerou-se prática regular de atividade física pelo menos três vezes por semana e pelo menos 30 minutos. Nos dados da doença foram incluídos antecedentes pessoais e familiares para hipertensão e problemas cardíacos, há quanto tempo sabe que é hipertenso e se já tinha tratado a doença anteriormente e abandonado o tratamento. O conhecimento sobre tratamento não medicamentoso incluiu perguntas como interrupção do fumo e ingestão de bebida alcoólica, prática regular de atividade física, redução do sal da alimentação e medidas anti-estresse. Atitudes frente ao tratamento medicamentoso foram investigadas com questões sobre esquecimento e horário de tomada dos remédios, se leva os medicamentos quando viaja, providência dos remédios antes de acabarem e uso dos medicamentos mesmo quando a pressão está controlada. Foi perguntado ainda, se houve interrupção do tratamento por conta própria e se faltou às consultas no último ano. Como tentativa de avaliar o sentimento do hipertenso em relação à sua vida, foi usado um diagrama com sete figuras de faces, Escala de Faces de Andrews, que é uma escala visual intervalar de 7 pontos , composta por faces estilizadas, referindo-se ao estado de humor que predominou frente à questão “Qual dessas faces melhor representa sua vida como um todo?”. Cada figura da escala consiste em um círculo com olhos que não mudam, e uma boca que varia desde um sorriso de quase meio-círculo voltado para cima, que reflete o sentimento de felicidade, até um outro meio-círculo, semelhante, voltado para baixo, que reflete o sentimento de tristeza (10).
A medida da pressão arterial foi realizada no início da entrevista com aparelho automático oscilométrico (OMROM - HEM 705CP) validado (11). O procedimento de medida da pressão arterial foi realizado de acordo com o preconizado pelas V Diretrizes Brasileiras de Hipertensão 2. A medida foi feita no membro superior esquerdo; na posição sentada; com o braço apoiado na altura do coração; após 5-10 minutos de repouso; três vezes consecutivas, sendo o intervalo entre uma e outra medida de um a dois minutos. Foram usados três aparelhos de medida da pressão, um para cada unidade e mensalmente cada aparelho foi usado com um outro aparelho para simultaneamente medir a pressão arterial de uma pessoa, na qual não houvesse nenhuma razão para se suspeitar que a pressão arterial nos dois braços fosse diferente. Se a medida pareada de pressão arterial concordou em até 4 mmHg (ou menos) tanto para pressão arterial sistólica como para a diastólica, os aparelhos foram considerados como calibrados.
Para a coleta dos dados contou-se com a participação de alunas de pós-graduação “senso stricto” e alunas bolsistas de Programas de Iniciação à Pesquisa do CNPq, devidamente treinadas.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Prefeitura Municipal de São Paulo.
Análise estatística
Os dados coletados foram tabulados e processados por meio do software SPSS (Statistical Package for Social Sciences) versão 7.5, por meio de estatísticas descritiva e analítica.
As variáveis classificatórias são apresentadas descritivamente em tabelas contendo frequências absolutas (n) e relativas (%). A relação entre as variáveis foi avaliada com o teste Qui-Quadrado ou Teste Exato de Fisher.
Foi realizada análise multivariada com modelo de regressão logística múltipla e foram introduzidas no modelo as variáveis que apresentaram p<0,05 na análise univariada. O nível de significância adotado foi de 0,05.
No que se refere ao controle da pressão arterial, neste estudo foram consideradas controladas as pessoas que após três medidas consecutivas, apresentaram média da pressão sistólica menor que 140 mm Hg e diastólica menor que 90 mm Hg. Os considerados não controlados apresentaram valores maiores ou iguais aos citados.
Resultados
Foram estudados 440 hipertensos com predominância do sexo feminino (66%), cor branca (51,7%), estado civil separado (52%), com 1º grau (52,1%), renda familiar de até cinco salários mínimos (65,4%). Quanto à ocupação observou-se maioria composta pelos aposentados e “do lar” (62%), e pequeno contingente (22,1 %) exercia ocupações manuais não especializadas.
Do total de hipertensos estudados 45,5% estavam controlados, ou seja, os níveis da pressão sistólica estavam abaixo de 140 mm Hg e da pressão diastólica menores que 90 mm Hg. Os níveis da pressão arterial dos controlados foram significativamente mais baixos do que os dos hipertensos não controlados (120,8±11,5/78,4±6,6 vs 154,3±18,7/97,7±12,1 mmHg, p<0,05).
Na caracterização dos hipertensos estudados verificou-se que nas variáveis biossociais, o gênero e idade influenciaram de forma significante (p<0,05) no controle da hipertensão arterial. As mulheres estavam mais controladas do que os hipertensos do sexo masculino (52,6 % vs 30,9 %). Os hipertensos controlados apresentam idade significativamente menor do que os não controlados (p<0,05, 55±12,3 vs 59±12,2 anos). As demais características tais como: etnia, estado civil, escolaridade, renda salarial e ocupação não influenciaram no controle da hipertensão arterial. Em relação aos hábitos de vida, a maioria dos entrevistados referiu nunca ter fumado (67,9%), ingerido bebidas alcoólicas (85,3%) e cerca da metade nunca praticou exercícios físicos regulares (53,2%). Os hipertensos não controlados referiram mais, não praticar exercícios físicos regularmente do que os controlados (64,5% vs 35,5%, p<0,05). Tabagismo e ingestão de bebida alcoólica não se associaram de forma significante ao controle da hipertensão. A maioria tinha mais de cinco anos de hipertensão (56,2%) e o tempo de doença relacionou-se com o controle da hipertensão, pois nessa faixa de tempo a maioria era formada por hipertensos não controlados (59,3% vs 41%, p<0,05). (Tabela 1)
O conhecimento dos hipertensos quanto ao tratamento não medicamentoso mostrou índices elevados como redução do o sal - 99,1%, parar de fumar - 94,3%, redução do peso - 93,8%, prática de exercícios físicos - 93,4% e redução da ingestão de bebida alcoólica - 92,5%. Dos conhecimentos avaliados o único que apresentou relevância estatística foi a prática de exercícios físicos, pois os hipertensos não controlados referiram mais desconhecimento de que atividade física ajuda no controle da hipertensão arterial, em relação aos hipertensos controlados (82,7% vs 17%, p<0,05). (Tabela 2)
Em relação às atitudes frente ao tratamento da hipertensão, observou-se que os hipertensos apontaram que sempre levam os remédios quando viajam (92,1%), sempre tomam os remédios no mesmo horário (68,2%), sempre providenciam os remédios antes de acabarem (87,8%) e sempre tomam remédio quando a pressão está controlada (66,7%). Apenas no item “toma remédio sempre no mesmo horário” os hipertensos não controlados indicaram ter essa atitude mais “raramente e às vezes” do que os controlados (86,7% e 62,5% vs 13,3% e 37,5%, respectivamente, p<0,05). A maioria dos hipertensos entrevistados afirmou que nunca faltou à consulta médica (71,8%), não interrompeu o tratamento (65,2%), e não tratou a hipertensão antes (57,1%). Verificou-se ainda, que os hipertensos não controlados em relação aos controlados foram significativamente diferentes (p<0,05) em relação à: realização de tratamento anterior para hipertensão (65,7% vs 34,2%), interrupção do tratamento (61,4 % vs 38,6%) e uso de três ou mais drogas anti-hipertensivas (60,5% vs 39,5%, p<0,05). O fato de faltar às consultas não se associou com o controle da hipertensão arterial (Tabela 3).
Em relação ao sentimento da sua vida como um todo, quando solicitados a apontarem em um diagrama com sete faces distribuídas na ordem da mais feliz para a menos feliz, cerca da metade dos hipertensos indicou as faces 1 e 2 que demonstravam mais alegria (51%). Um pequeno percentual (10,2%) indicou as faces 6 e 7 que estão no extremo da escala indicando maior grau de tristeza. Os dados da tabela 4 mostram que houve associação significante (p<0,05) entre o controle da hipertensão e a referência dos hipertensos controlados e não controlados de como se sentiam em relação à sua vida como um todo. Observou-se uma tendência na indicação das faces 5 e 6 que representam mais tristeza, no grupo de hipertensos não controlados em relação aos controlados.
Na análise de regressão logística foram introduzidas no modelo as seguintes variáveis que apresentaram p<0,05: sexo, idade, realização de exercício físico, tempo de hipertensão, antecedente familiar para problema cardíaco, conhecimento sobre a prática de exercícios físicos, atitude de tomar os remédios sempre no mesmo horário, tratamento anterior para hipertensão, interrupção do tratamento, número de drogas anti-hipertensivas, sentimento em relação à vida como um todo. Após os ajustes no modelo de regressão logística, a falta de controle nos hipertensos estudados se associou com realização de tratamento anterior para hipertensão, ausência de antecedentes familiares para problemas cardíacos e falta de conhecimento sobre a influência da prática de atividade física no tratamento da hipertensão (Tabela 5).
Discussão
O principal resultado do presente estudo mostrou que nas três Unidades Básicas de Saúde em que o estudo foi realizado, menos da metade dos hipertensos estava com a pressão arterial controlada. Dentre as variáveis estudas na análise univariada, algumas tiveram influência significante (p<0,05) no controle da hipertensão arterial, tais como idade, sexo, tempo de doença, tratamento anterior para hipertensão, antecedentes familiares para doença cardíaca, prática de exercícios físicos e sua influência no tratamento da hipertensão, interrupção do tratamento, tomar remédio no mesmo horário, número de drogas anti-hipertensivas, e como se sente em relação a sua vida como um todo.
A variável gênero, merece atenção espacial no contexto da hipertensão arterial. Apesar de não se identificar diferenças significativas na prevalência da doença entre homens e mulheres, no aspecto adesão ao tratamento e conseqüente controle dos níveis da pressão arterial observa-se comportamento distintos. Estudo (12) realizado em nosso meio mostrou que homens, jovens, não brancos se relacionaram com desconhecimento sobre a hipertensão e tratamento, característica que pode influenciar negativamente no controle da hipertensão. Sousa (13) em investigação sobre a prevalência da hipertensão arterial referida, percepção de sua origem e formas de controle em área da metropolitana de São Paulo, mostrou que as mulheres foram as que mais procuraram pela assistência e pondera que as mulheres parecem ter uma percepção mais acurada de sua condição de saúde e também desenvolvem maiores relações com os serviços de saúde em razão de seus atributos e funções reprodutivas. Destaca-se, ainda, os resultados entre homens e mulheres em um estudo (14) com hipertensos de segmentos sociais pauperizados do Vale do Paraíba-SP. Os achados indicaram que para os homens, os seguintes fatores de risco estiveram associados à hipertensão: viver na zona rural (ORaj=2,00; p=0,01); etilismo (ORaj= 1,90; p=0,03) e idade acima de 40 anos (ORaj=3,10; p<0,0001). Famílias numerosas, com mais de seis pessoas exerceram efeito protetor (ORaj=0,46; p=0,02). Para mulheres, os fatores de risco associados foram: ausência de escolaridade (ORaj= 2,37; p=0,0003); sedentarismo (ORaj=1,71; p=0,04); obesidade acompanhada de baixa estatura (ORaj= 4,66; p <0,0001) e idade acima de 40 anos ( ORaj=5,29; p=0,01).
No Brasil, em um dos primeiros estudos (15) sobre o assunto, verificou-se que a maior taxa de abandono ao tratamento da hipertensão ocorria entre homens, analfabetos, e com idade entre 20 e 40 anos. De forma similar estudo mais recente (13), também observou que homens tendem ser menos aderentes ao tratamento anti-hipertensivo.
A idade também foi uma variável que se destacou no presente estudo. A pressão arterial sistólica tende a aumentar com a idade e a pressão arterial diastólica eleva-se até os 50 anos em homens e 60 anos em mulheres (2), década na qual que se encontrava a média de idade dos hipertensos estudados. Estudo de coorte (16) realizado na cidade de Porto Alegre mostrou que o abandono ao tratamento anti-hipertensivo se associou com tabagismo, escolaridade inferior ou igual a 5 anos e menos de 5 anos de doença, e aumento da idade com maior probabilidade de seguimento . Por outro lado, investigação (13) com hipertensos na cidade de São Paulo evidenciou que maiores níveis tensionais no seguimento destas pessoas se relacionaram com idade acima de 60 anos, além de baixa escolaridade, baixa renda e mais de 5 anos de hipertensão 13. Em outro estudo de base populacional, para levantar a freqüência de idosos aderentes e avaliar se a polifarmácia interfere na adesão ao tratamento, a freqüência de idosos aderentes foi de 37,1% e maior entre os que utilizavam menos fármacos (17) .
Considera-se que haja associação direta entre aumento da idade e maior envolvimento com a problemática de saúde dos hipertensos, o que deveria repercutir em maior controle da doença. Talvez, em determinadas situações tal ocorrência seja mascarada pelas próprias características do envelhecimento com crescente complexidade da doença e assistência.
Quanto às características relativas ao diagnóstico dos hipertensos, o tempo de doença e ter realizado tratamento anterior para hipertensão foram os dados que tiveram influência significante no controle da pressão arterial, pois hipertensos com mais tempo de diagnóstico apresentaram-se menos controlados. Tais resultados diferem dos encontrados por outros estudos (3,4) que observaram que a média de tempo de diagnóstico dos hipertensos foi de 11 anos, sendo que os controlados encontravam-se em tratamento há mais tempo. Nesse contexto merecem ser destacadas a característica da cronicidade da doença, ausência de sintomatologia específica e complicações de longo prazo advindas do não controle da hipertensão, que aliados ao tempo de doença tendem a se constituírem em fatores dificultadores ao processo de adesão ao tratamento e conseqüente controle satisfatório dos níveis tensionais. A magnitude da importância da variável “realização de tratamento anterior“ foi confirmada pela sua permanência no modelo de regressão logística, pois o fato de já ter realizado tratamento para hipertensão arterial contribuiu para elevar a chance de falta de controle em 2,63 vezes.
Os hábitos e estilos de vida também são variáveis que devem ser avaliadas na caracterização da clientela hipertensa pelo destaque que possuem em relação às medidas do tratamento não medicamentoso. A adoção de estilos de vida saudáveis como restrição da ingestão de bebida alcoólica, abolição do tabagismo, planejamento alimentar com redução do sal e alimentos hipercalóricos, manejo de situações estressantes e atividade física regular, devem fazer parte da assistência direcionada aos hipertensos. Sabe-se que a adoção de um estilo de vida saudável está intimamente relacionada à melhoria da qualidade de vida e interfere de forma positiva no controle da hipertensão arterial. No presente estudo, verificou-se, inclusive, que os hipertensos não controlados realizavam menos atividade física, o que sem dúvida contribui para controle menos efetivo da hipertensão. A redução da pressão arterial ocorre mesmo com atividades leves como três sessões semanais com 20 minutos de duração, tanto em hipertensos como em normotensos, sendo mais eficiente no primeiro grupo (18) . Portanto, as pessoas hipertensas ou não, devem ser estimuladas a iniciar programas de exercícios físicos regulares. As orientações das V Diretrizes Brasileiras de Hipertensão (2) recomendam a prática regular de atividade física aeróbica como caminhadas por pelo menos 30 minutos por dia 3 a 5 vezes / semana.
O conhecimento sobre a doença e tratamento também é uma variável que pode influenciar no controle da hipertensão arterial, que por sua vez está intimamente relacionado à adesão ao tratamento. Dados de estudos (3,4,19,20,21) mostraram que de um modo geral os hipertensos possuem a informação sobre sua problemática de saúde, porém não estão devidamente controlados. A discrepância entre ter informação a respeito da doença e tratamento, e conseguir controlar a pressão arterial aponta para a diferença essencial entre conhecimento e adesão. Enquanto o conhecimento é racional, adesão é um processo complexo, envolvendo fatores emocionais e barreiras concretas, de ordem prática e logística (22,23). Como pode ser verificado, no presente estudo, tanto os hipertensos controlados quanto os não controlados apresentaram conhecimento satisfatório sobre as formas não medicamentosas de tratamento, só se diferiram em relação à atividade física, pois mais uma vez os não controlados se destacaram pelo pouco conhecimento. A falta de conhecimentos sobre a importância da atividade física regular no controle da hipertensão pode ser confirmada pela persistência dessa variável na análise multivariada, elevando em 3,49 vezes a chance de falta de controle da doença.
Acrescenta-se ao cenário de fatores intervenientes no controle da hipertensão, as crenças de saúde, antecedentes familiares mórbidos e atitudes frente ao tratamento, com destaque para o histórico familiar para a hipertensão e fatores de risco cardiovasculares, inclusive a análise multivariada revelou que a ausência de antecedentes familiares para problemas cardíacos contribuiu em 2,16 vezes para a falta de controle da hipertensão. Os comportamento e atitudes são de longa data e para se obter mudanças ou minimizar atitudes que possam comprometer a realização adequada do tratamento requer da equipe de saúde conhecimento e habilidade de práticas de educação. A educação das pessoas com doenças crônicas como a hipertensão, tem como finalidade influenciar o comportamento do hipertenso na obtenção de mudanças e manutenção das mesmas. Os objetivos educacionais se relacionam a: ajudar o hipertenso a entender, conhecer e aceitar a doença; conhecer e reconhecer comportamentos de risco; informar sobre decisões do tratamento e diagnóstico; negociar e cumprir propostas de tratamento; e enfrentar problemas de manutenção do tratamento (14). A identificação de atitudes como levar os remédios quando viajam, determinar horário para tomada dos remédios, providenciar os remédios antes que acabem, não deixar de tomar os remédios por conta própria e não faltar às consultas são exemplos de ações que reforçam atitudes positivas de comportamento frente ao tratamento.
Características do tratamento medicamentoso anti-hipertensivo também podem influenciar no controle, como acesso aos medicamentos, efeitos indesejáveis, tratamento por toda vida além da proposição de esquemas terapêuticos com várias drogas (24,25). Para alcançar o objetivo terapêutico muitas vezes são necessárias associações de vários medicamentos. Estudos têm demonstrado que, em média, são necessárias pelo menos três classes terapêuticas para o controle almejado da pressão arterial (26) . Fato esse encontrado no presente estudo, pois os hipertensos não controlados estavam sob tratamento com três ou mais drogas. Nesse sentido o uso de terapia combinada fixa pode facilitar.
Os fatores psicossociais também interferem na realização do tratamento no contexto das doenças crônicas, como a hipertensão arterial. A auto-eficácia reflete a percepção individual ou crenças sobre a capacidade em participar de determinadas atividades, com a finalidade de manter comportamentos para reduzir riscos. A auto-motivação relaciona-se ao componente individual da ação para garantir a adesão. A auto-estima relaciona-se a auto-eficácia e é importante na redefinição de auto conceito e mudanças de papéis e estilos de vida. A relação entre características da personalidade e realização do tratamento é controversa, porém, variáveis como sentimento de bem estar, socialização e capacidade de ser igual a outros são elementos de medida da personalidade e podem se associar com o seguimento do tratamento e consequente controle da doença (27,28). Na tentativa de se avaliar como se sentiam em relação à sua vida como um todo, na presente investigação, observou-se que o controle associou-se com esse sentimento. O achado de mais tristeza no grupo de hipertensos não controlados pode ser um indicativo a mais de necessidade de atenção especial a essa clientela.
Uma das limitações metodológicas do presente estudo é o desenho de corte transversal que talvez não possibilite identificar se os fatores que se associaram à falta de controle da hipertensão, resultantes do modelo de regressão logística, são decorrentes ou antecedentes à doença como a falta de conhecimento sobre a prática de exercícios físicos e ausência de antecedentes familiares para problemas cardíacos. Por outro lado, a terceira variável, ”já ter realizado tratamento para hipertensão” também presente no modelo, pode relacionar-se diretamente à falta de controle da doença pelo fato de que os hipertensos não controlados possuíam mais tempo de doença, referiram mais faltar às consultas e interromper o tratamento. Destaca-se ainda, que o presente estudo foi realizado em Unidades Básicas de Saúde com peculiaridades da clientela atendida que sofre influência direta do contexto sócio econômico pouco favorecido, o que sem dúvida pode contribuir ainda mais para uma adesão menos intensa ao tratamento e menor controle da hipertensão, portanto, pode diferir do controle real da população hipertensa. Acrescenta-se também a esse cenário, o fato de que as unidades onde o estudo foi realizado apresentam características que as diferem de outras unidades de saúde, em função da atuação da universidade nos serviços.
Atualmente, existem medidas terapêuticas, farmacológicas e não farmacológicas, realmente eficazes para o tratamento da hipertensão. Porém, tem-se verificado taxas insatisfatórias no controle da doença, expondo os hipertensos aos malefícios advindos das complicações. Considera-se que a falta de controle apresenta relação direta com a equivalente falta de adesão ao tratamento. A adesão, por sua vez, envolve uma gama de fatores, muitos deles coincidentes com os fatores de risco para a própria hipertensão arterial. Na estratificação do risco individual dos hipertensos, a busca por variáveis, além daquelas determinadas em Consensos e Guias, pode ser um pré-requisito importante para o reconhecimento de possibilidades que podem influenciar na almejada adesão ao tratamento e controle adequado da doença, além de evitar o abandono ao tratamento.
Em síntese, o presente artigo mostrou que o controle da hipertensão arterial foi pouco satisfatório, pois menos da metade dos hipertensos estava controlada o que pode ser reflexo da baixa adesão ao tratamento e é um problema que deve ser enfrentado por todos: a pessoa hipertensa, família, comunidade, instituições e equipe de saúde. As políticas públicas de atenção à saúde devem ser direcionadas a todos, porém, merece atenção especial a parcela não controlada dos hipertensos que deve ser contemplada com estratégias especiais de promoção, prevenção e controle, para minimizar ou evitar complicações decorrentes da doença não controlada.
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