0376/2025 - ACESSO EQUITATIVO A VACINA: DESAFIOS E ENFRENTAMENTOS NA EFETIVAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE IMUNIZAÇÃO EM ANGOLA E BRASIL
EQUITABLE ACCESS TO VACCINES: CHALLENGES AND STRATEGIES FOR THE IMPLEMENTATION OF IMMUNIZATION PUBLIC POLICIES IN ANGOLA AND BRAZIL
Autor:
• Graziela de Paula Povrezan - Povrezan, GP - <grazieladepaulapovrezan@gmail.com>ORCID: https://orcid.org/0009-0000-1627-467X
Coautor(es):
• Eduardo Carvalho de Souza - Souza, EC - <eduardo_carvalho21@hotmail.com>ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2494-1177
• Lourdes Conceição Martins - Martins, LC - <lourdesc@unisantos.br>
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9996-2725
• Elda de Oliveira - Oliveira, E - <eldadeoliveira@gmail.com>
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9973-0948
• Viviane Silva de Paula - Paula, VS - <vivianepaula@santos.sp.gov.br>
ORCID: https://orcid.org/0009-0001-9752-7890
• Luzana Mackevicius Bernardes - Bernardes, LM - <luzana.bermardes@unisantos.br>
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2226-9484
Resumo:
Este ensaio analisa os desafios e as estratégias relacionadas ao acesso equitativo às vacinas em Angola e no Brasil, à luz das políticas públicas de imunização. Trata-se de uma reflexão fundamentada na teoria da justiça como equidade de John Rawls. Em Angola, observa-se a fragilidade da infraestrutura em saúde, a dependência de doações internacionais e a baixa cobertura vacinal em áreas rurais. No Brasil, destacam-se a hesitação vacinal, as desigualdades regionais e os impactos da desinformação, apesar da existência de um programa nacional consolidado. Ambos os países enfrentam barreiras logísticas, estruturais e sociais, mas também apresentam experiências exitosas, como o uso de tecnologias para ampliar a cobertura vacinal, o fortalecimento de instituições e o engajamento comunitário. Conclui-se que o acesso equitativo à imunização requer investimentos integrados em infraestrutura, inovação tecnológica, formação de profissionais de saúde, estratégias comunicacionais e cooperação internacional, a fim de garantir a universalidade do direito à saúde e reduzir as desigualdades.Palavras-chave:
Vacina; Equidade; Políticas públicas; Angola; Brasil.Abstract:
This essay analyzes the challenges and strategies related to equitable access to vaccines in Angola and Brazil, in light of public immunization policies. It is a reflection grounded in John Rawls' theory of justice as fairness. In Angola, there is evidence of weak health infrastructure, dependence on international donations, and low vaccination coverage in rural areas. In Brazil, vaccine hesitancy, regional inequalities, and the impacts of misinformation stand out, despite the existence of a well-established national immunization program. Both countries face logistical, structural, and social barriers, but also present successful experiences, such as the use of technology to expand vaccination coverage, the strengthening of institutions, and community engagement. It is concluded that equitable access to immunization requires integrated investments in infrastructure, technological innovation, health professional training, communication strategies, and international cooperation, in order to ensure the universality of the right to health and reduce inequalities.Keywords:
Vaccine; Equity; Public policies; Angola; Brazil.Conteúdo:
A vacinação é uma das estratégias mais eficazes de saúde pública para prevenir doenças transmissíveis, reduzir a mortalidade infantil e promover a equidade em saúde 1,2. Apesar de sua comprovada eficácia, o acesso às vacinas permanece desigual em muitas regiões do mundo, especialmente nos países de baixa e média renda, onde as barreiras estruturais, sociais, políticas e econômicas comprometem a efetividade das políticas de imunização 3,4.
Angola e Brasil representam dois contextos distintos, porém atravessados por desafios comuns relacionados à cobertura vacinal. Angola, marcada por um sistema de saúde fragilizado, apresenta graves dificuldades logísticas, baixa capacidade de produção local e forte dependência de doações internacionais para garantir o abastecimento de vacinas, sobretudo em áreas rurais 4,5–8.
Em contraposição, o Brasil conta com o Programa Nacional de Imunizações (PNI), referência internacional por sua abrangência e capilaridade 9, 10. Contudo, desde 2016, o país enfrenta uma preocupante queda nas coberturas vacinais, intensificada pela pandemia de COVID-19 e agravada por fatores como a hesitação vacinal, a desinformação disseminada nas redes sociais e a desigualdade regional no acesso aos serviços de saúde 11-14, 15.
A hesitação vacinal, compreendida como o atraso ou recusa da vacinação mesmo diante da disponibilidade dos imunizantes, ganhou força no Brasil a partir da polarização política e da circulação de notícias falsas, afetando negativamente a confiança da população nas campanhas de imunização 12,13. Essa dinâmica também está presente em Angola, onde a desinformação, somada à escassez de ações educativas e à limitação de infraestrutura, contribui para a baixa adesão às vacinas 3,6.
Paralelamente, iniciativas exitosas em ambos os países demonstram caminhos possíveis: Angola tem buscado parcerias internacionais para o fortalecimento de sua capacidade local, enquanto o Brasil aposta na digitalização dos sistemas de informação e em estratégias de microplanejamento para enfrentar as lacunas vacinais 16,17.
No contexto da saúde coletiva, o debate sobre a equidade vacinal articula-se diretamente à noção de justiça social. Neste sentido, a teoria da justiça como equidade de John Rawls oferece um arcabouço conceitual potente para analisar a distribuição desigual dos bens primários, como a saúde e, em especial, o acesso às vacinas 18,19. Rawls propõe que a justiça só é efetiva quando as desigualdades são ajustadas em favor dos mais vulneráveis, o que torna inaceitáveis os persistentes abismos entre populações urbanas e rurais, ou entre diferentes regiões e grupos sociais 20,21.
A crise sanitária provocada pela pandemia evidenciou as fragilidades dos sistemas de saúde e a ineficiência de abordagens tradicionais de imunização. Diante disso, torna-se urgente refletir sobre políticas públicas de saúde e social que garantam o acesso universal e equitativo às vacinas como expressão do direito à saúde e da cidadania plena 22-24. A cooperação internacional, o fortalecimento dos sistemas de vigilância, a valorização dos profissionais de saúde e o engajamento comunitário configuram estratégias fundamentais para superar as desigualdades vacinais e promover justiça distributiva no campo da saúde pública.
Este ensaio tem como objetivo refletir sobre os desafios e estratégias relacionadas ao acesso equitativo às vacinas em Angola e no Brasil, à luz das políticas públicas de imunização e com base na teoria da justiça como equidade. Busca assim, contribuir para o debate acerca das possibilidades de fortalecimento das ações de imunização, com vistas a promoção da equidade e a garantia do direito à saúde.
DESAFIOS ESTRUTURAIS E ESTRATÉGIAS DE VACINAÇÃO EM ANGOLA
O acesso desigual à vacinação em Angola revela os limites da universalidade da saúde como direito em contextos de vulnerabilidade extrema. Mesmo sendo um país com avanços normativos no campo da saúde, Angola enfrenta desafios históricos e persistentes relacionados à infraestrutura, à dependência externa, à escassez de profissionais e à limitada capacidade de resposta às necessidades locais 3-5.
O Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) estima que mais de 50% das crianças em áreas rurais do país nunca foram vacinadas, o que expressa uma situação de exclusão estrutural que compromete as metas de cobertura vacinal e amplia o risco de reemergência de doenças imunopreveníveis 3,5,7. Essa realidade não é apenas estatística: ela representa uma violação do princípio de equidade e exige reflexão crítica sobre as condições que produzem e perpetuam tais desigualdades.
A infraestrutura física e organizacional da rede de saúde pública angolana é precária, caracterizada pela escassez de unidades em zonas remotas, dificuldade de transporte e armazenamento de vacinas e ausência de recursos humanos qualificados 4,6. Esses entraves limitam o alcance das campanhas de vacinação, especialmente em populações dispersas, em situação de pobreza extrema e com baixa escolaridade. A ausência de um sistema robusto de vigilância epidemiológica e informação em saúde compromete o monitoramento das coberturas, a identificação de lacunas e a formulação de estratégias responsivas ao território 5.
Adicionalmente, Angola depende majoritariamente de doações internacionais para garantir o fornecimento de vacinas, o que impõe instabilidade ao sistema e restringe sua soberania sanitária16. Organizações multilaterais, como a aliança Global Alliance for Vaccines and Immunization (GAVI), Organização Mundial da Saúde (OMS) e Unicef, são responsáveis por boa parte do suprimento de imunobiológicos, o que tem sido crucial, mas também reforça uma lógica de dependência16,25. Durante a pandemia de COVID-19, por exemplo, a dificuldade de acesso às vacinas evidenciou a desigualdade na distribuição global e deixou países como Angola na retaguarda das prioridades internacionais4.
Apesar dos desafios, o país tem desenvolvido experiências inovadoras para enfrentar parte desses obstáculos. Entre elas, destacam-se as estratégias de mobilização social voltadas à conscientização e adesão da população às campanhas de vacinação, com apoio de materiais pedagógicos adaptados à realidade local, como os Manuais do Vacinador Campeão e de Comunicação Interpessoal8. Essas ações são viabilizadas por profissionais de saúde e mobilizadores sociais que, com apoio de organizações internacionais, percorrem comunidades remotas, dialogam com líderes religiosos e utilizam linguagens acessíveis para fortalecer a confiança nas vacinas8,16. Nesse contexto, a comunicação se torna um elemento chave para a equidade, uma vez que valoriza as especificidades culturais e territoriais das populações atendidas.
É necessário, contudo, reconhecer que essas estratégias operam sobre um terreno marcado por desigualdades múltiplas. As mulheres, especialmente nas zonas rurais, enfrentam obstáculos adicionais ao acesso à imunização: mobilidade limitada, sobrecarga de cuidados domésticos, ausência de políticas específicas e vulnerabilidade sócioeconômica8. Essa interseção entre gênero, território e pobreza amplia os efeitos da injustiça sanitária e reforça a necessidade de abordagens sensíveis às dimensões sociais da equidade.
Do ponto de vista teórico, a situação angolana pode ser interpretada a partir do conceito de justiça como equidade proposto por John Rawls. A má distribuição dos "bens primários", como a saúde, e a ausência de medidas compensatórias que favoreçam os mais desfavorecidos violam o chamado "princípio da diferença", segundo o qual desigualdades só são justificáveis se beneficiam os menos favorecidos18. Em Angola, os grupos mais excluídos do acesso à vacinação, como crianças em zonas rurais, populações ribeirinhas e mulheres em situação de pobreza, são exatamente os que menos se beneficiam do sistema.
Para avançar na promoção da equidade vacinal no país, é imprescindível que as estratégias em curso sejam acompanhadas por políticas estruturantes: fortalecimento da capacidade estatal, ampliação da produção local de imunobiológicos, qualificação da atenção primária à saúde, inclusão de recortes de gênero e raça nas políticas públicas, além do aprofundamento de mecanismos de cooperação internacional.
Apesar da limitação de estudos exclusivamente voltados para Angola, há evidências na literatura que contribuem para compreender o cenário vacinal no país. No distrito de Ombadja, a implementação de ações como reorganização das sessões de vacinação extramuros, engajamento de agentes comunitários de saúde na busca ativa de crianças não vacinadas, capacitações contínuas e melhorias na cadeia de suprimento resultou, entre 2017 e 2018, em aumento de 22,3% no total de doses aplicadas e elevação da cobertura de vacinação com três doses contra difteria, tétano e coqueluche (DTP3) de 59% para 71%26.
Adicionalmente, estudos multicêntricos que incluem Angola apontam que desafios como barreiras geográficas, limitações na infraestrutura e dificuldades de acesso exigem estratégias adaptadas às realidades locais, sobretudo em comunidades remotas, para garantir avanços sustentáveis nas coberturas vacinais27.
INIQUIDADES E ENFRENTAMENTOS NA COBERTURA VACINAL NO BRASIL
O Brasil possui um dos programas públicos de vacinação mais amplos e exitosos do mundo. Criado em 1973, o PNI tornou-se um dos pilares do Sistema Único de Saúde (SUS), garantindo o acesso universal, gratuito e integral à imunização por meio de uma rede capilarizada de serviços 10,17. A trajetória do PNI é marcada por conquistas emblemáticas, como a erradicação da varíola, a eliminação da poliomielite e o controle de diversas doenças imunopreveníveis, que evidenciam sua capacidade técnica, institucional e social. No entanto, nas últimas décadas, essa política pública tem enfrentado desafios cada vez mais complexos, culminando em uma acentuada queda das coberturas vacinais, especialmente a partir de 2016, e intensificada durante a pandemia de COVID-19 11,14.
Esse declínio não é homogêneo, nem meramente circunstancial. Trata-se de um fenômeno multicausal, que articula fatores comunicacionais, políticos, culturais e estruturais. Entre eles, destaca-se a hesitação vacinal, impulsionada pela desinformação, pelo enfraquecimento da autoridade científica e pela crise de confiança nas instituições públicas 12, 13. A circulação de fake news e de discursos antivacina nas redes sociais contribuiu para criar um ambiente de insegurança e desconfiança, dificultando a adesão às campanhas de imunização e fragilizando o vínculo entre Estado e sociedade 11,12. A pandemia agravou esse cenário, ao mesmo tempo em que expôs a centralidade da vacinação como estratégia coletiva de cuidado e proteção.
Antes da pandemia, a hesitação vacinal no Brasil apresentava dinâmica distinta da atual. Inquérito nacional realizado nas 27 capitais (2007–2008) mostrou que a proporção de crianças com esquema vacinal completo aos 18 meses era menor justamente nos setores censitários do quintil socioeconômico mais elevado, enquanto as demais faixas apresentavam coberturas iguais ou superiores. Esses achados sugerem a presença da hesitação vacinal nesse grupo social e o êxito do PNI em alcançar altas coberturas em áreas mais vulneráveis28.
De forma semelhante, estudo com as coortes de nascimento de Pelotas (1982, 1993, 2004 e 2015) identificou que, na coorte de 2015, a cobertura vacinal completa no primeiro ano de vida foi mais elevada entre crianças de famílias de menor renda, invertendo o padrão pró-rico observado nas décadas anteriores. Os autores apontam que tal mudança pode estar relacionada ao surgimento da hesitação vacinal entre famílias de maior nível socioeconômico29.
Com o início da pandemia de COVID-19 e a intensificação da circulação de falsas notícias, há indícios de que as características dessa hesitação se modificaram e passaram a afetar, de forma mais acentuada, grupos socialmente vulneráveis. Diversos estudos apontam que, no período pós-pandemia, a queda das coberturas vacinais foi mais pronunciada em contextos de maior pobreza, evidenciando o agravamento das desigualdades no acesso e na adesão à imunização.
Contudo, os obstáculos à imunização não se limitam ao campo simbólico. Desigualdades regionais, raciais e socioeconômicas impactam diretamente a capacidade de acesso efetivo à vacinação. Crianças indígenas, negras, ribeirinhas, quilombolas e residentes em favelas ou comunidades rurais têm menor probabilidade de completar o esquema vacinal, mesmo quando formalmente incluídas na política pública de saúde 14,21,22. A fragmentação da rede de atenção básica, o desfinanciamento das ações de vigilância em saúde e a escassez de profissionais em áreas remotas comprometem a integralidade do cuidado. O acesso universal, previsto em lei, se converte em acesso diferenciado na prática, revelando um sistema que ainda não conseguiu materializar o princípio da equidade como eixo orientador.
No Brasil, o PNI mantém ações específicas para populações indígenas e para áreas de fronteira, coordenadas pelo Departamento do Programa Nacional de Imunização (DPNI). No caso dos povos indígenas, a vacinação é conduzida pelos 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs), com estratégias adaptadas às particularidades epidemiológicas, geográficas e culturais de cada território, incluindo a execução das ações no interior das aldeias e a priorização desses grupos nas campanhas nacionais30,31.
Em áreas de fronteira, caracterizadas por intensa mobilidade populacional e risco acrescido de circulação de doenças, as estratégias incluem o planejamento integrado entre municípios, ações de vacinação em pontos estratégicos e adequações logísticas para alcançar comunidades em locais de difícil acesso. Apesar desses esforços, a execução dessas ações no território apresenta heterogeneidades, com variações nas coberturas e na capacidade operacional entre regiões, o que pode ser interpretado como fragmentação das ações quando há limitações de articulação local ou integração intersetorial30,31.
Essas distorções estruturais são reforçadas pela ausência de estratégias duradouras de enfrentamento das iniquidades. Embora existam iniciativas como o microplanejamento territorial, a busca ativa de não vacinados e a vacinação extramuros têm ocorrido de forma pontual, muitas vezes sustentadas por esforços locais e sem articulação sistêmica 11,14,17,26. A lógica de campanha, ainda predominante, não é suficiente para alcançar grupos historicamente marginalizados, cuja exclusão se reproduz nas políticas públicas por meio da invisibilização, da descontinuidade e da ausência de escuta qualificada.
Sob a perspectiva da justiça como equidade, proposta por John Rawls, a realidade brasileira evidencia a não observância do chamado "princípio da diferença", que orienta a compensação das desigualdades em favor dos menos favorecidos 18,19. Em vez de atuar como instrumento redistributivo, o sistema vacinal brasileiro tem reproduzido padrões de desigualdade social. Ao não priorizar os territórios e populações com menor cobertura, o Estado falha em sua função corretiva, aprofundando as assimetrias de oportunidade e proteção social. A vacinação, nesse contexto, deixa de ser apenas uma questão de saúde pública e passa a ser um termômetro da justiça distributiva no país.
Apesar desse cenário exposto do Brasil, é preciso reconhecer que o SUS oferece importantes mecanismos de resistência e reinvenção. Profissionais da atenção primária, gestores municipais e movimentos sociais têm desempenhado papel central na retomada da confiança pública, no enfrentamento da desinformação e na construção de estratégias territorializadas de cuidado. A revalorização do pacto federativo, o fortalecimento da vigilância em saúde e o investimento em comunicação em saúde baseada em evidências são caminhos promissores para reverter o atual quadro26,27.
Tornar o acesso à vacinação equitativo no Brasil exige mais do que recuperar coberturas estatísticas: exige uma reconstrução ética, política e cultural do valor da vida coletiva. Exige também um compromisso efetivo com a priorização dos grupos historicamente excluídos, com financiamento sustentável e com políticas intersetoriais que combatam as múltiplas formas de exclusão que ainda persistem. Trata-se de reafirmar o SUS não apenas como sistema, mas como projeto de justiça social em curso.
ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE ANGOLA E BRASIL EM RELAÇÃO ÀS ESTRATÉGIAS VACINAIS
A imunização, reconhecida como um direito fundamental, assume contornos distintos e desafiadores em países atravessados por desigualdades estruturais, como Angola e Brasil. Embora inseridos em contextos históricos e políticos distintos, ambos enfrentam barreiras que comprometem a universalidade e a equidade no acesso às vacinas, desafios que extrapolam a cobertura estatística e revelam falhas sistêmicas na forma como os Estados lidam com desigualdade, exclusão e responsabilidade coletiva pelo cuidado.
Nesse sentido, evidencia-se que os entraves à equidade vacinal em Angola e no Brasil não decorrem unicamente de lacunas operacionais, mas de configurações históricas e políticas que moldam as possibilidades de acesso, participação e reconhecimento no interior dos sistemas de saúde. A imunização, nesse contexto, atua como marcador das desigualdades estruturais e do lugar que determinados grupos ocupam ou deixam de ocupar no imaginário coletivo e nas prioridades estatais. Em ambos os países, observa-se a dificuldade dos sistemas de saúde em assegurar a imunização como um bem público confiável, acessível e orientado por princípios de justiça social5,9.
A teoria da justiça como equidade, proposta por John Rawls, oferece um arcabouço analítico potente para compreender essas falhas. Segundo Rawls, a justiça não pode ser entendida apenas como igualdade formal de oportunidades, mas exige um conjunto de instituições básicas que assegurem, de forma real e concreta, que os bens primários, como a saúde, estejam acessíveis a todos, com prioridade àqueles em piores condições18. No Brasil, apesar da existência formal de um sistema universal e de uma política nacional de imunização consolidada, o enfraquecimento das instâncias de coordenação federal, o desfinanciamento do SUS e a fragmentação das ações nos territórios resultam em coberturas desiguais que não obedecem a critérios redistributivos 9,21,26.
Historicamente, o PNI no nível federal adotou estratégias consistentes para ampliar as coberturas vacinais, entre elas o microplanejamento, abordagem que adapta ações de vacinação às especificidades de cada território. Contudo, nos últimos anos, a redução da coordenação e da execução dessas estratégias no âmbito nacional contribuiu para o enfraquecimento das ações locais e para o declínio das coberturas34.
Angola e Brasil evidenciam que o desafio da equidade vacinal está menos na existência de políticas públicas e mais na capacidade dessas políticas de se orientarem por princípios de justiça redistributiva. Vacinar não é apenas um ato técnico, mas uma escolha ética e política: uma decisão de quem importa, quem merece cuidado e quem será protegido pelo Estado. Tanto em contextos de ausência institucional (como em Angola), quanto em cenários de desmonte seletivo (como no Brasil), a imunização expõe as falhas do contrato social e a dificuldade de concretizar a saúde como direito de todos e dever do Estado.
EQUIDADE VACINAL EM ANGOLA E BRASIL CONFORME A TEORIA DA JUSTIÇA DE RAWLS
A teoria da justiça como equidade oferece uma oportunidade potente para refletir sobre as desigualdades nos sistemas de saúde e, em particular, sobre o acesso desigual às vacinas em contextos marcados por vulnerabilidades estruturais, como Angola e Brasil. Ao propor que a justiça social deve ser pensada a partir de um contrato original em que os sujeitos escolhem princípios sem conhecer suas posições sociais, Rawls fundamenta a ideia de que as instituições básicas devem garantir a distribuição justa dos chamados “bens primários”, entre eles, a saúde, as liberdades básicas e as bases sociais do respeito mútuo 18.
Nesse sentido, ao destacar a centralidade das liberdades básicas, Rawls reforça que elas correspondem ao conjunto de direitos fundamentais políticos, civis e de consciência que garantem a todos a possibilidade de participar plenamente da sociedade, de forma justa e igualitária18.
No centro de sua teoria está o princípio da diferença, segundo o qual desigualdades só são moralmente justificáveis se beneficiarem aqueles em piores condições. No campo da saúde coletiva, isso significa que políticas públicas de imunização devem ser desenhadas e implementadas de modo a priorizar as populações historicamente mais excluídas do cuidado e da proteção social, o que inclui crianças em situação de pobreza, populações indígenas, negras, ribeirinhas e periféricas, tanto no Brasil quanto em Angola.
Nessa perspectiva Rawlsiana, a equidade em saúde não pode ser confundida com distribuição igualitária, mas sim com ações redistributivas que levem em conta os contextos de desigualdade e vulnerabilidade social19. Isso implica reconhecer que o acesso formal a vacinas não é suficiente: é preciso garantir que os sujeitos e territórios em desvantagem social e de saúde tenham prioridade real nas estratégias de cuidado, financiamento, informação e infraestrutura.
No caso angolano, a ausência de autonomia sanitária, a forte dependência de doações internacionais e a limitação da capacidade estatal de responder às necessidades locais revelam uma situação em que os mais vulneráveis, como crianças em áreas rurais e mulheres com restrições de mobilidade, não apenas não são priorizados, como seguem sistematicamente excluídos do acesso às vacinas. Isso configura uma violação direta ao princípio da diferença, já que as desigualdades estruturais não são compensadas por políticas redistributivas eficazes 18,19.
No Brasil, embora o país disponha de um programa nacional de imunização consolidado e de um sistema público de saúde com base universal, as desigualdades regionais e sociais se perpetuam, muitas vezes de forma silenciosa. A queda nas coberturas vacinais entre populações vulneráveis, somada à hesitação vacinal e à desinformação, evidencia que as políticas públicas não têm operado com ênfase na equidade, mas sim na padronização. Isso significa que o SUS, ainda que formalmente justo, pode se tornar injusto na prática, ao não conseguir corrigir desigualdades de ponto de partida que impedem o acesso real às ações de saúde 19.
A justiça como equidade, nesse sentido, oferece uma lente ética e política para avaliar as estratégias de imunização não apenas pelo alcance numérico, mas pelo seu impacto redistributivo. A pergunta central deixa de ser “quantos foram vacinados?” e passa a ser “quem ainda não foi vacinado — e por quê?”. Trata-se de exigir das políticas públicas um compromisso efetivo com os mais vulneráveis, o que exige planejamento territorializado, financiamento adequado, escuta comunitária e valorização das práticas locais.
Em ambos os países, as experiências positivas identificadas, como o microplanejamento no Brasil e a comunicação culturalmente sensível em Angola, representam exemplos concretos de ações orientadas por uma lógica de equidade, mesmo que ainda de forma pontual. A partir da teoria de Rawls, essas práticas devem deixar de ser exceção e tornar-se a regra: não se trata apenas de vacinar mais, mas de vacinar melhor, com justiça e com prioridade ética àqueles historicamente deixados para trás.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este ensaio buscou refletir sobre os desafios e estratégias relacionados à equidade vacinal em Angola e no Brasil, à luz das políticas públicas de imunização e com base na teoria da justiça como equidade, formulada por John Rawls. A partir de uma análise crítica de evidências disponíveis, foi possível identificar que, apesar das diferenças estruturais e históricas entre os países, ambos enfrentam barreiras profundas que comprometem a efetivação do direito à vacinação de forma universal, integral e equitativa.
A análise desses contextos sob a perspectiva Rawlsiana evidenciou que os sistemas de imunização, em ambos os países, falham ao não adotar estratégias redistributivas que priorizem os sujeitos e territórios em maior desvantagem. A justiça como equidade requer mais do que acesso formal: exige ações concretas para corrigir as desigualdades de ponto de partida, por meio de instituições que atuem de forma deliberada para beneficiar os menos favorecidos. A imunização, nesse sentido, é mais do que uma ação sanitária, é expressão da justiça distributiva em sua dimensão mais concreta e cotidiana.
Ao longo do ensaio, identificaram-se também experiências exitosas que apontam caminhos possíveis: o microplanejamento e a vacinação extramuros no Brasil; a comunicação culturalmente sensível e a mobilização comunitária em Angola. Essas práticas demonstram que a equidade vacinal pode ser construída a partir dos territórios, desde que haja compromisso institucional, financiamento adequado e valorização dos saberes locais.
Conclui-se, portanto, que a promoção da equidade vacinal exige uma abordagem ética e política que vá além da cobertura estatística. É preciso compreender a vacinação como um ato coletivo de responsabilidade social e como uma ferramenta de justiça redistributiva. Em contextos de desigualdade persistente, a garantia do acesso às vacinas revela não apenas a capacidade dos sistemas de saúde, mas o tipo de pacto social que se deseja sustentar.
Declaração de Disponibilidade de Dados
Não se aplica.
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