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Artigos

1245/2008 - PRINCÍPIOS ÉTICOS COMO NORTEADORES NO CUIDADO DOMICILIAR
THE ETHICAL PRINCIPLES GUIDE HOW THE CARE HOME

Autor:

• LETICIA ROSA SANTOS - Santos L. R - BRASILIA, DISTRITO FEDERAL - CENTRO UNIVERSITARIO EURO AMERICANO - <tenenteleticia@yahoo.com.br>


Área Temática:

Não Categorizado

Resumo:

RESUMO: O cuidado domiciliar é uma estratégia de atenção à saúde que visa enfatizar a autonomia do paciente, bem como realçar habilidades funcionais em seu contexto domiciliar. O objetivo é refletir a observância dos princípios éticos no cuidado domiciliar na modalidade de assistência domiciliar. O estudo é do tipo exploratório descritivo contemplando uma revisão crítica da bibliografia, sendo estes analisados pela técnica de Análise de Conteúdo de Bardin. O cuidado domiciliar vem tornando-se imprescindível para reduzir custos hospitalares, permanência hospitalar, número de reinternações e o número de complicações clínicas, bem como o aumento da participação da família no cuidado ao paciente, proporcionando uma melhor qualidade de vida. Entretanto, é necessário levar em consideração a finalidade e qualidade desta assistência prestada, analisando-a sob a ótica dos princípios éticos, de modo a não tornar este tipo de cuidado benéfico apenas para uma das partes, e sim um bem comum a todos os sujeitos envolvidos nesse cuidado.
PALAVRAS-CHAVES: Enfermagem, Ética, Cuidado Domiciliar.

Abstract:

ABSTRACT: The care home is a strategy of primary health care to emphasize the autonomy of the patient, and enhance functional abilities in your household context. The goal is to reflect that the ethical principles in the care home in the form of home care. The study is descriptive of the type exploratory contemplating a critical review of the literature, which are analysed by the technique of the Content Analysis of Bardin. The care home has become essential to reduce hospital costs, hospital stay, number of readmissions and the number of clinical complications, as well as the increased participation of the family in caring for the patient, providing a better quality of life. However, it is necessary to take into account the purpose and quality of care provided, examining it from the perspective of ethical principles, so as not to make this type of care benefits for only one of the parties involved, but a common good.
KEY WORDS: Nursing, Ethics, Care Home.

Conteúdo:

INTRODUÇÃO

Atualmente, o cuidado de enfermagem domiciliar está em pauta, em decorrência, principalmente, de necessidades sociais e de saúde da população. A atenção no domicílio agrega mais que um “tratamento médico residencial padronizado", pois realça as habilidades funcionais do paciente, enfatizando sua autonomia1.
O foco deste estudo reside no que se refere à modalidade de assistência domiciliar. Tal modalidade engloba situações de cuidado intermitente por um dano agudo ou agravo de longa duração, envolvendo ações educativas e/ou realização de procedimentos que visam a redução do dano e a prevenção.
Vários os fatores que justificam a tendência à implantação de serviços de cuidado domiciliar, tais como: diminuição de complicações clínicas, reinternações, hipertrofia dos serviços de emergência, custos hospitalares e óbitos, bem como uma maior participação da família no cuidado2. Entretanto, para que tal estratégia seja benéfica para todos os seguimentos da sociedade, é necessário relacionar suas justificativas à luz dos princípios éticos. Existem várias perspectivas de abordagem ética, as quais consideram diferentes características e modelos explicativos, desenvolvidos a partir de diferentes referenciais teóricos no contexto da tomada de decisão moral. Um dos modelos mais difundidos na área da saúde é o Principialista, defendida por Tom Beauchamp e James Childress3.
A abordagem dos quatro princípios de ética biomédica de Beauchamp e Childress3 ou Principialismo como ficou conhecida mundialmente se orienta por quatro princípios: o princípio da beneficência diz respeito à obrigação moral de agir em benefício dos outros, ou seja fazer ou promover o bem, assim como impedir e eliminar males ou danos; o de não-maleficiência que preconiza acima de tudo não causar mal ou dano as pessoas; o princípio da justiça obrigação ética de tratar cada pessoa de acordo com o que é certo e adequado e dar o que lhe é devido; e, por fim, o princípio da autonomia condição de liberdade ou independência para a escolha de alternativas sem qualquer tipo de controlem e a capacidade do indivíduo agir intencionalmente.
O Principialismo teve grande destaque na década de 70 e até hoje é adotado, porém tem sido criticado por aplicar os princípios de modo essencialmente objetivo e racional. Embora existam diversas abordagens das questões éticas que divergiram em decorrência das diferentes visões de mundo e da evolução dos conhecimentos, algumas noções ainda perduram, como a de agir de acordo com o bem. Os princípios constituem um referencial ético concreto, que apresenta um valor metodológico importante que permite reduzir incertezas no campo das ações biomédicas.
Frente a este contexto faz-se necessário refletir a observância dos princípios éticos no cuidado domiciliar na modalidade de assistência domiciliar.

MÉTODO

Trata-se de um estudo exploratório descritivo, caracterizado por uma revisão crítica da bibliografia sobre como o cuidado domiciliar discute os princípios éticos a luz da teoria de Beauchamp e Childress3. Para tanto, realizou-se uma busca de publicações indexadas nas seguintes bases de dados: LILACS, MEDLINE, SciELO, BDENF e CAPES, utilizando-se como descritor controlado o cuidado domiciliar (na modalidade assistência domiliciar), foco deste estudo. Posteriormente, as fontes encontradas foram confrontadas com teoria dos quatro princípios para que fossem selecionadas para a análise final.
A localização dos documentos ocorreu por intermédio de comutação bibliográfica, avesso de acervo disponível on line e acervos particulares de pesquisadores da área.
Os estudos foram analisados com base na técnica de Análise de Conteúdo de Bardin4, em que foram elaboradas três categorias pré-estabelecidas. Assim, respondeu-se às seguintes questões:
 Os profissionais de saúde respeitam o princípio da beneficência e não-maleficência ao delegarem suas funções aos cuidadores informais, e estes têm condições de atuarem como provedores do cuidado no domicílio?
 Estamos oferecendo o cuidado domiciliar obedecendo ao princípio de justiça, como uma modalidade ou impondo como uma alternativa mais conveniente para a instituição e/ou sistema de saúde?
 O cuidado domiciliar oportuniza a autonomia do paciente e da família no que se refere a esta estratégia assistencial?
Os princípios éticos foram respeitados, procurando proteger os direitos devido à utilização dos referenciais bibliográficos, para a construção deste estudo.

RESULTADOS
Os temas relacionados às categorias foram:
Quadro 1 – Categorias e Temas, 2008.

Beneficência e Não-maleficência
Observa-se que os serviços de atendimento domiciliário no Brasil estiveram quase sempre ligados a área da Saúde Pública, visando a promoção da saúde e a prevenção de doenças2. Mundialmente, essa estratégia assistencial está difundindo-se rapidamente devido a questão econômica, sendo esta um dos três fatores mais importantes no seu crescimento5.
Diante desse contexto, as implementações de programas de cuidado domiciliares precisam privilegiar o cuidado humano no seu contexto natural, bem como fatores que justificam tal implementação referem-se à: transição do perfil demográfico e epidemiológico da população brasileira, ocasionando um aumento de doenças crônico-degenerativas acompanhadas do risco de complicações e do nível de dependência; a inadequação do atual Sistema de Saúde, em que questões não emergenciais poderiam ser resolvidas em nível de atenção básica, bem como a existência de uma boa articulação com os demais níveis de atenção, fato este que denota uma importante falha no sistema de referência e contra-referência, sendo isto percebido através da hipertrofia em emergências; adoção, do Programa de Saúde da Família (PSF) que tem a maioria de suas ações em nível primário de atenção, sendo necessário complementar as ações através do Programa de Saúde Domiciliar com a enfermeira implementando ações de promoção à saúde, sendo o foco na educação em saúde; a família passa por transformações na sua organização - de extensa para nuclear -em que as funções de cuidado são, paulatinamente, compartilhadas com instituições criadas para esse fim 2,3,6,7.
Vários estudos apontam que o cuidado domiciliar diminui o tempo médio de internação hospitalar; reduz o número de reinternações; reduz custos de atenção à saúde; aumenta a aderência ao tratamento do paciente sob assistência domiciliar; nota-se a melhora da qualidade de vida do paciente e familiar; desenvolve-se como um novo instrumento de ensino aos graduandos; e abertura de um novo campo de ação em pesquisa. Portanto, tal estratégia proporciona maior conscientização ao paciente e cuidador do quadro patológico atual e conseqüentemente maior autonomia no tratamento, bem como as prioridades de cuidado ao paciente no domicílio são muito diferentes do cuidado realizado no hospital3,5,8,9,10,11.
Entretanto, o despreparo do cuidador, pode também, trazer sérios prejuízos ao paciente, resultando, inclusive em freqüentes hospitalizações 12. Além disso, o despreparo pode gerar ansiedade e maior desgaste físico, ocasionando situações de risco para ambos 13,14. Estudo demonstra quem 67,5% dos cuidadores relataram ter dificuldades para realizar o cuidado. As dificuldades manifestadas pelos cuidadores não expressam apenas dificuldades específicas a atividades referentes ao cuidado, mas sim relacionadas à dinâmica familiar e aos sentimentos dos cuidadores 15,16. Para cuidar de um adulto dependente é necessário ter condicionamento físico capaz de dar conta de tarefas pesadas, como a locomoção e outras, além de recuperar-se rapidamente, por exemplo, de uma noite mal dormida.
Quanto ao aspecto ético-legal é o mesmo tanto na instituição como no domicílio. Porém os profissionais devem estar cientes e conscientes quanto à perda do manto corporativo hospitalar que até hoje encobriu o abuso de poder, omissões, negligências e imperícias6.
As ações do Programa de Saúde da Família (PSF), na sua maioria, contemplam o nível primário de atenção, sendo necessário complementar as ações através do Programa de Saúde Domiciliar com a enfermeira implementando ações de promoção à saúde tendo o foco na educação em saúde6.
Para o cuidado domiciliar acontecer, deve-se iniciar o planejamento no ambiente hospitalar, em que a família/cuidador é submetida às limitações que porventura podem surgir, assim permite gradativamente garantir um cuidado adequado no domicílio. O acompanhamento do paciente no domicílio pode ser diário, semanal, quinzenal, mensal de acordo com a sua situação clínica2,9.
Alguns estudos apontam que o planejamento do cuidado domiciliar inicialmente é uma proposta do médico e enfermeira, os quais decidem se o paciente tem condições de receber esse tipo de acompanhamento no domicílio. No entanto, são poucos os estudos que destacam a participação da família/cuidador no momento da decisão sobre a utilização dessa estratégia assistencial6,17.
Nesse momento deve-se considerar a organização familiar e comunitária para integrar-se o sistema de cuidado do profissional de saúde com o sistema de cuidado popular exercido pelo grupo familiar ou rede de apoio social do paciente. Assim, a parceria entre profissionais e pessoas que cuidam deve possibilitar a sistematização de tarefas a serem realizadas no domicílio, privilegiando ações de promoção à saúde, prevenção de incapacidades, manutenção da capacidade funcional, evitando na medida do possível, hospitalizações, asilamentos, outras formas de segregação e isolamento 3,7,18.
O espaço domiciliar permite lidar com situações novas proporcionando constante aprendizado ao profissional de saúde. Porém, tal estratégia coloca o enfermeiro numa posição que exige capacidade de decisão e autonomia, em que está sob sua responsabilidade técnica e legal. Frente a este contexto, a falta de capacitação em assistência domiciliar geram dificuldades quanto ao exercício profissional, exercício da autonomia, habilidades de relacionamento interpessoal, bem como de relação de ajuda5,6.
Em relação ao acesso e vínculo autores do Estados Unidos destacam que o cuidado domiciliar deve assegurar acesso á todos os serviços, independente de onde residam. Na Espanha o cuidado domiciliar e o hospital devem estar organizados adequadamente, financiados e integrados para prover tal atendimento de forma contínua e eficaz. No Brasil, o cuidado domiciliar seria a interface entre a Unidade Básica de Saúde e a rede hospitalar, implementando terapias no próprio domicílio, e quando necessário nos locais para cuidados de atenção de saúde primária8,19.
Justiça
Os custos relacionados ao sistema de saúde são sempre questões preocupantes para os envolvidos com a área. Estudos mostram que as intervenções na assistência domiciliária equivalem a aproximadamente um terço do custo das intervenções realizadas em ambiente hospitalar, sendo seu custo médio diário de paciente em cuidado domiciliar de R$6,48, bem inferior ao dos pacientes internado2,20.
O modelo de cuidado domiciliares apresenta inúmeras vantagens para as instituições e sistemas de saúde, entre elas reduzir o custo do tratamento, diminuir o número de diárias, baixar custos dos serviços de saúde (gastos com instalações e equipamentos), não pagar serviços cobrados por pacotes (como taxa de aplicações, soro etc)2,18,21.
Esta modalidade de cuidado, nas instituições permite uma maior rotatividade de seus leitos otimizando a dinâmica de ocupação dos mesmos. A transferência dos pacientes crônicos e convalescentes para o cuidado domiciliar libera o leito hospitalar, abrindo espaço para pacientes instáveis que precisam realmente de UTI’s, cirurgias, politraumatizados e outras enfermidades agudas, ampliando assim a oferta de leitos, diminuindo a média de permanência hospitalar as reinternações e conseqüentemente os custos assistenciais. Além disso, o paciente crônico geram menor receita em sua estada/dia para as instituições e sistemas de saúde o que tornariam-no um paciente ideal para ser indicado ao cuidado domiciliar22.
A otimização de seus leitos acarretará uma maior margem de lucro pelo fato da instituição não precisar elevar o seu efetivo de pessoal, mas permitirá capacita-lo melhor com treinamentos mais específicos. Por sua vez, o dinheiro que seria destinado à obras de expansão poderia ser canalizado para a melhoria do atendimento, aquisição de equipamentos mais modernos e outras prioridades antes não previstas 8, 20.
A implantação de serviços de saúde domiciliar pode ser a estratégia que possibilitará um maior aproveitamento dos leitos hospitalares oferecendo serviços de saúde ao público com maior eficiência e economia possíveis, reduzindo custos através da diminuição tanto do tempo das estadias nos hospitais quanto dos índices de internação hospitalar23.
Sem exceção todos os modelos de saúde visam baixar o custo, aumentar a produtividade dos profissionais e aumentar o benefício para a clientela. Os custos gerados por essa dependência são tão grandes quanto o investimento de dedicar um membro da família ou um cuidador para ajudar continuamente uma pessoa que, muitas vezes, irá viver mais 10 ou 20 anos, sendo assim, esta modalidade de cuidado não poderá ter como única finalidade baratear custos e transferir responsabilidades20.
É importante ressaltar, no entanto, que isso não significa que a assistência domiciliária seja “barata”, mas que, comparativamente ao sistema hospitalar, seu custo é significativamente inferior2,24.
O cuidado domiciliar também visa benefícios para os clientes, sendo este tipo de assistência uma forma de na atual conjuntura de nosso sistema de saúde sobrecarregado e sem recursos suficientes para a presente demanda de clientes, a garantia de continuidade da assistência com o apoio de uma equipe de saúde interdisciplinar e viabilizando ao cliente os recursos terapêuticos e a assistência profissional que teria no hospital8,23,25,26.
O cuidado domiciliar visa melhorar a qualidade de vida e propiciar acompanhamento domiciliário dos pacientes crônicos e daqueles nos quais já foram esgotadas todas as possibilidades de tratamento especializado. Essa assistência engloba a visitação domiciliar e cuidados domiciliares que vão desde o fornecimento de equipamentos, até ações terapêuticas mais complexas3,18.
E como salientado, a redução do tempo de internação e reinternações não trás somente vantagens para as instituições no que tange aos custos mas também aos indivíduos que correm menos riscos em conseqüência das hospitalizações e propicia a utilização dos leitos por um número maior de pessoas, ampliando a oferta de leitos, ou seja, agiliza a liberação de leitos da unidade hospitalar destinados a doentes passíveis de hospitalização ou a portadores de casos mais graves6.
Diante dos custos hospitalares elevados e do baixo benefício resultantes das internações, os cuidados secundários estão sendo deslocados para os ambulatórios e para o domicílio do cliente. Pois se mantendo o atual modelo centrado na hospitalização significará criar uma situação de superlotação das unidades hospitalares, ocupadas por doentes idosos, com doenças crônico-degenerativas, aumentando os custos da assistência à saúde e comprometendo a qualidade do atendimento5,6,8,20.
A assistência domiciliar é um prolongamento do tratamento hospitalar e pode permitir a alta precoce dos doentes internados, diminuindo seu tempo de permanência e, em decorrência, ampliando a capacidade de internação, suprindo o problemas de carência de vagas11,23,27.
O atual contexto econômico e social com um aumento crescente da demanda dos serviços de saúde, necessitam de um modelo de atenção a saúde que otimizem os recursos escassos, desta forma o cuidado domiciliar surge como modelo harmônico com a economia vigente e que propicia uma adequada assistência as necessidades dos usuários 8,18,20.
Autonomia
A tomada de decisão quanto a permanência em casa ou no hospital do paciente pode ocorrer de diversas formas: por indicação médica3,8,28, um trabalho da equipe interdisciplinar onde realiza-se discussão de casos em conjunto e as decisões são conhecidas por toda equipe23, ou em conjunto, num processo dinâmico entre a família os profissionais de saúde e o paciente 3,5,29.
Outro estudo aponta questões importantes quanto as formas de indicação dos pacientes para este tipo de assistência, a seleção pode ocorrer de diversas formas, além da já citada decisão prévia de um integrante da equipe de saúde, existem ainda a sobrecarga da equipe ou envio de pacientes “pesados e incômodos” para as instituições hospitalares8, não existindo nestas ultimas opções, quaisquer critérios de “benéficos” para o cliente .
Com relação à compreensão sobre a assistência domiciliar à saúde, observa-se que os profissionais podem considerá-la sob duas perspectivas: a de uma prática hierarquizada e impositiva, na qual são destacados os aspectos envolvidos diretamente com a dimensão biológica do adoecimento, e a facilitação do atendimento; e a perspectiva relacional e interativa, como forma de atenção diferenciada e de práticas inovadoras de construção da saúde30.
Na Europa, a forma de financiamento determina quem toma a decisão de encaminhar os doentes para assistência domiciliar. Nos serviços “públicos” o acesso independe do encaminhamento do médico. Já nos que são financiados pela rede privada de saúde, a questão se inverte e a indicação médica passa a ser pré-requisito. No Brasil, não existe um padrão preestabelecido, mas há um predomínio da indicação médica, uma vez que a Lei 10.424 de 200231, e a Portaria 2.421 de 199832 já colocam as diretrizes para o funcionamento do Home Care e como os Serviços de Saúde atendem os seus clientes. Assim, é necessário que o médico indique e solicite a internação ou assistência domiciliar para esse paciente ao serviço de Home Care. No setor privado, os casos são detectados pelos médicos assistentes ou médicos auditores, que identificam situações de internações prolongadas ou de reinternações múltiplas5.
Porém, deve-se levar em conta que a decisão é uma escolha entre duas ou mais opções ou alternativas. Quando uma pessoa não tem opção, não decide. Apenas adere a uma situação31,33, atualmente a tendência do governo é reduzir os investimentos na rede hospitalar e transferir estes gastos para os programas de saúde da família e de cuidado domiciliar ,34.
Um dos grandes objetivos da assistência domiciliar é a busca da autonomia do paciente no processo de tomada de decisões sobre seu cuidado. No hospital é o doente que se adapta ao meio, no domicílio é o profissional que precisa se adaptar2,5,27. O atendimento domiciliário representa uma estratégia de atenção à saúde que engloba muito mais do que o simples fornecimento de um tratamento médico residencial, é um método aplicado ao cliente que enfatiza sua autonomia e esforça-se em realçar suas habilidades funcionais dentro de seu próprio ambiente2, ,35 visa proporcionar maior tranqüilidade à família no cuidado de seu familiar doente3 e principalmente ajudar o cliente e a família a ter um estilo de vida saudável, independente à doença ou problema de saúde e de seu tratamento6,34,36.
A autonomia inclui a capacidade para a auto-determinação, para resistir a pressões sociais, para pensar e agir de maneira mais independente. A relação entre os membros de uma família, no cuidado domiciliar durante o processo da doença é mantida, existe uma autonomia em ocupar o seu espaço ou seja, cada um ocupa uma posição na estrutura familiar. Durante a hospitalização os papéis estão pré-definidos, uns são doentes, outros acompanhantes e os profissionais de saúde, os mandantes. Todos submetidos a regras elaboradas para garantir o andamento do serviço, o que nem sempre significa o melhor para quem está hospitalizado29. Um estudo realizado com pacientes hospitalizados revelou que o nível de autonomia dos mesmos quando internados era muito baixo, ficando o mesmo submisso às decisões de terceiros32,34.
A concorrência pela ocupação de leitos hospitalares e as filas de espera das instituições podem acarretar, por parte das famílias, uma insegurança quanto uma possível reinternação. Cabe à equipe de saúde respeitar a decisão da família e proporcionar uma assistência adequada ao espaço e condições ou circunstâncias que a situação se apresenta29.
Autonomia também deve ocorrer por parte dos profissionais, embora ainda seja pouco observada, desta forma os enfermeiros devem questionar o sistema de saúde e reivindicar recursos que respondam às necessidades dos pacientes, tendo estes direito ao cuidado: é dever dos enfermeiros prestarem esses cuidados37, tendo todo o respaldo legal, conforme a Lei 10.42431, já citada e a Resolução do COFEN nº 267/0138. Para a realização da assistência domiciliar à saúde, os profissionais apontam para a necessidade das práticas diferenciadas, mas ainda existem algumas dificuldades em sua implementação29.

DISCUSSÃO E CONCLUSÕES

Ao refletir sobre as questões éticas no cuidado domiciliar, percebemos a necessidade das instituições de saúde e de seus profissionais proporcionarem ao paciente e cuidador um atendimento que realmente contemplem as necessidades de saúde no domicílio.
As perspectivas relacionadas ao cuidado domiciliar são crescentes. Observa-se o interesse de muitos profissionais, bem como o incremento na formação de profissionais capacitados para abordarem o planejamento, coordenação e avaliação das ações a fim de constituir um processo contínuo de articulação com demais setores, cujas ações estejam relacionadas ao paciente e a família.
O futuro aponta para novos espaços e novas relações de trabalho para a Enfermagem n que se refere ao atendimento domiciliar, em que o trabalho empregado na prestação do cuidado deve ser revisado, bem como as formas contratuais exercidas atualmente.
Refletindo sobre os fatores que justificam o cuidado domiciliar e relacionando com os princípios éticos, como a beneficência, percebemos que a permanência hospitalar prolongada, e as re-hospitalizações contribuem para a elevação dos custos ao Sistema Único de Saúde e num maior risco ao paciente em contrair infecções nosocomiais. Assim, justifica-se a internação domiciliar, por se caracterizar em um cuidado que proporciona uma melhor qualidade de vida ao paciente e sua família.
Em contrapartida, a família inserida nesta ação de cuidado toma para si a responsabilidade que seria de um profissional. Assim, é necessário avaliar e respeitar as condições e limitações da família. Quando esta não consegue conviver com a presença de um paciente em casa, o cuidado domiciliar pode acarretar em malefícios para o usuário e para a família.
A respeito do principio da justiça, uma vez que as instituições de saúde visam a redução dos custos com internações e uma maior utilização de seus leitos, a indicação do cuidado domiciliar para alguns usuários, apresenta-se como uma alternativa de assistência à saúde.
Por outro lado, cuidado domiciliar garante ao cliente condições de recuperação de sua saúde e continuidade do acompanhamento para além do hospital. Em decorrência da carência de recursos na área da saúde, o cuidado domiciliar se mostra como forma de garantir a atenção e atendimento às necessidades dos clientes.
É necessário questionar se estamos oferecendo o cuidado domiciliar como uma modalidade ou como a alternativa mais conveniente para a instituição e/ou sistema de saúde.
Diante de algumas reflexões a capacidade de decidir por si mesmo, ou seja, a autonomia tanto do paciente como da família, para a opção do cuidado domiciliar pode ser desrespeitada, pois deixa de ser uma opção e passa a ser um imposição das instituições hospitalares.
E por outro lado este tipo de cuidado oportuniza a autonomia do paciente e da família no que se refere ao auto-cuidado no espaço domiciliar. Esta estratégia possibilita uma autonomia do cliente e da família uma vez que o primeiro deixa de ser o doente e a família deixa de ser o acompanhante, passando todos a ocupar uma posição na estrutura familiar, ou seja, a mãe continua sendo mãe, a filha sendo filha.
Finalizamos que o cuidado domiciliar de uma forma inovadora vem tornando-se imprescindível para reduzir custos hospitalares, permanência hospitalar, número de reinternações e o número de complicações clínicas, bem como o aumento da participação da família no cuidado ao paciente, proporcionando uma melhor qualidade de vida. Entretanto, é necessário levar em conta a finalidade e qualidade desta assistência prestada, analisando-a sob a ótica dos princípios éticos, de modo a não tornar este tipo de cuidado benéfico apenas para uma das partes envolvidas, e sim um bem comum.
Os indicadores de avaliação usualmente utilizados, são: a adesão terapêutica por parte dos pacientes; a segurança na realização de cuidados no domicílio; a satisfação por parte do paciente e sua família com o atendimento fornecido; o grau de ansiedade com a situação vivenciada; a identificação de riscos; a participação da família no tratamento; o alcance do autocuidado; a adesão a ações de educação e saúde; o número de intercorrências e reinternações; a otimização do leito hospitalar e do atendimento ambulatorial; a redução de custos.
A valorização da família27 é uma atitude fundamental para estabelecer vínculo e confiança, como: cumprir as combinações, sensibilizar-se com as situações encontradas no domicílio, estando abertos a flexibilização do plano.
Salienta-se3 que o cuidado realizado pelo enfermeiro no domicílio tem por objetivo a avaliação de indicadores de risco para infecção e orientações para o autocuidado e cuidado familiar frente às necessidades humanas básicas afetadas que influenciam no desenvolvimento das atividades de vida diárias.
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38Brasil. Resolução COFEN nº 267/01, de 05 de outubro de 2001. Aprova a atividades de Enfermagem em Domicílio Home Care [on-line] 2001 out 05 [acessado 2008 mar 05]. Disponível em: http://www.coren-rj.org.br/site/resolucoes/RES_COFEN_267_2001.swf.


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